Encontro de irmãos


Na letargia de um final de noite, onde todos os programas nos parecem incrivelmente banais e de semelhança quase siamesa, foi carregando nos botões do controlo remoto da televisão, seguindo com uma apatia cega o que no ecrã passava.
Via-se de tudo, desde mulheres que miracolosamente perdiam 15 Kg, até à novela da coitadinha da emigrante de frança que se transformou no ódio de estimação de uma dona de hotel lá para os lados dos Algraves.

A internet, essa tinha decidido mais uma vez fazer greve seguindo a linha de todos os sectores laborais de Portugal, e eu ali, sentado num sofá a fazer pandant com as almofadas.
De repente na RTP 1 o que vejo??? Judite Sousa na sua grande entrevista, bom, já estávamos em melhor caminho, só que subitamente despertei e percebi que a entrevistada era a irmã de Álvaro Cunhal , sim a própria, Maria Eugénia Cunhal, que finalmente decidiu falar sobre o irmão....
Poderia agora até dizer que o tema já tinha sido sufocado, tal foi o impacto que teve a sua morte nos media deste país em que nada se passa, mas não, era uma entrevista que falava de amor, de amor entre irmãos, de uma história de luta e de grande cumplicidade entre uma família que se habituou às amarguras do Cárcere do filho pródigo.
Judite de Sousa no seu melhor e comovida, lá ia perguntando aquele mulher belissíma, como era conviver com um Ser como foi Alvaro Cunhal, e as respostas eram das mais doces e simples que só um comunista puro sabe dar.
Todos os segredos que não partilhou a não ser com o seu partido, foram explicados sem o minímo resentimento "É que o partido e a família acabam por se diluir um no outro." E por isso as intruções sobre o seu funeral que a família soube apenas no momento era porque "não era para sabermos antes, nada adiantava, soubemos quanto tivemos que saber".
Só em 94 Maria Eugénia soube que também era a irmã de Manuel Tiago, pois até lá nunca percebeu que era o mesmo homem, seu irmão o autor de fabuloso livro.
Maria Eugénia acabou de por ler um poema que escreveu ao irmão enquanto este se encontrava no exílio, creio que entitulado "Quando Voltares", percebi mais uma vez que o amor que os une não tinha distância e que aquele Homem sabia amar muito os seus e que aquela irmã o respeitou e admirou de uma forma maravilhosa e quando ele finalmente voltou em 74 deixou que os camaradas do partido o abraçassem em primeiro lugar, pois tinha se dado a primeira vitória de uma luta que nunca terminará. Depois veio o tão esperado abraço entre irmãos, e como diz o poema de Maria Eugénia, Quando tu voltares já não vais encontrar a menina de saia e tranças. Mas encontrou quem profundamente o admirava e o amou até ao fim...
Este post é para ti Vespinha!!!

11 comentários:

vague disse...

Bom dia mocho falante :)

Apesar de radicalmente da minha ideologia acho q isso não interessa para nadam ne, neste post nem na vida, nem nos amigos.

Tenho pena de ter perdido essa entrevista, pelo homem que ele foi, reconhecidamente inteligente e coerente (e apesar de não concordar com muitas das suas ideias, presto homenagem à sua enorme inteligência) e pela conversa de irmãos. A irmã é realmente uma mulher bela e a filha igualmente. Um aspecto da vida privada que ele sempre quis preservar como tal. E para mim, isso é certo pq nisso me identificaria se fosse uma 'figura pública'.
Um beijo, noctívago ;)

(De uma madrugadora q ag já está com sono...)

vague disse...

rectifico, 1ª linha: 'radicalmente diferente'
2ª linha; 'nada', nem'.

Caracolinha disse...

Também tive a sorte de poder ter assistido a esta excelente entrevista conduzida por aquela que é, em minha opinião, uma das melhores jornalistas do panorama nacional.

A Judite de Sousa é excelente porque se sabe adaptar às pessoas que tem à sua frente e retirar delas o melhoe que têm. Lembro-me em particular de uma entrevista que ela fez ao Sr Jerónimo de Sousa. Fenomenal a postura e o respeito pelo seu passado de operário fabril. Nada de que ele se devesse envergonhar. E algo por que ela teve o maior respeito.

Agora a entrevistada de ontem ... eu, como sabes, tenho particular devoção por pessoas mais velhas, por tudo aquilo que o passar dos anos parece conferir às pessoas. Fiquei maravilhada com aquela mulher. Pela beleza que hoje ainda sabe conservar e pela sensibilidade e arrebatamento das palavras.

É absolutamente assombroso podermos saber que todas estas pessoas sofreram na pele as maiores angústias em nome de uma verdade em que acreditavam. Mais uma história de vida que nos deixa a pensar que devemos sempre lutar por aquilo em que acreditamos.

Apesar de não ser da sua cor política fui prestar homenagem a essa figura incontornável da nossa história, que foi o Dr Álvaro Cunhal, pela força da sua crença, inteligência e sensibilidade.

Nunca me vou esquecer da visita que fiz à prisão de Peniche, de ver os seus desenhos e tocar nas barras das celas e de me ter emocionado muito.

A nossa GRANDE, QUERIDA e ÚNICA VESPINHA é inteiramente credora desta grande homenagem por ser uma mulher de crenças e de luta. Uma mulher que eu vou admirando mais a cada dia que passa.

Assim como a ti.

Beijo Emocionado ~:o)

Isabel Filipe disse...

Oi Mocho Falante...
Gostei do teu texto...
Vim agradecer-te a tua visita e dizer que fico à espera das tua bicadas...

Bastet disse...

Diluídas as diferenças ideológicas ficam as semelhanças humanas e a homenagem que se presta a quem foi um homem de carisma e de convicções. Belo post mochinho! :)

Leonor disse...

a irmã do Cunhal... linda, revelando um carácter sensível, e uma vivência perseguida e castrada. não há como fugir a determinados momentos da vida política que o país viveu um dia.
ainda bem que a internet fez greve porque assim viste uma coisa diferente e bonita.

abraço da leonor

Mocho Falante disse...

É verdade leonoreta, nem sequer me irritei com a netcabo, acabei por ter oportunidade de ver uma entrevista maravilhosa, cheia de carinho e amor

Mocho Falante disse...

Isabel, volta sempre aqui ao meu ninho és muito bem vinda ou será benvinda???

Vespinha disse...

Gente de outra "fibra".

Gente que soube estar calada quando queria falar.

Gente que soube estar em silêncio quando os outros o queriam quebrar.

Gente que partilhou o pouco que tinha e que não tinha.

Gente que me ofereceu a liberdade mas que também me ensinou a respeitá-la.

Gente que amo.Profundamente.

Vespinha Kamarada emocionada com a dedicatória do Post...

Mocho Falante disse...

Enfim...gente que soube estar!!!

th disse...

Vi de relance, já no fim, e só mais tarde, ou tarde demais me apercebi quem era a entrevistada. Tb eu tenho tirado férias da Tv, pelo pouco interesse dos programas. São vidas e relações enriquecedoras e fico-te grata pelo post, que me trouxe uma mais valia. Beijo agradecido, th

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